Hoje, primeiro recebi a notícia da grande operação Pégasus, realizada pela polícia federal, para reprimir corridas e os excessos de velocidade na BR-40. Depois a notícia da morte de mais dois motociclistas na Via Lagos. Apesar de não estarem na mesma estrada, fazem parte de um mesmo assunto.
O motociclismo, ainda mais o motociclismo praticado com motocicletas de alta potência, é extremamente perigoso e difícil. O avanço e as capacidades das novas motocicletas excede em muito as capacidades e investimentos que os motociclistas fazem neles mesmos. Para possuir uma moto esporte com 180cv nada demais é requerido do comprador, apenas dinheiro. E ao possuir uma máquinas destas, seu dono passa automáticamente e se sentir e comportar como piloto, como autoridade no assunto. No seu prédio, no trabalho, onde for. Ele pára sua moto e é reconhecido como “fera”. E gosta dessa sensação, pagou mais caro por isso. É típico do Brasil, mais importa o que vc tem do que o que vc é.
Muitos nem gostam tanto de moto, gostam mais é dos ganhos periféricos, da fama de audaz, de juventude, de esportividade.
O problema começa quando ele acredita nisso e começa a ter resistência a qualquer situação que quebre o encanto. Qualquer indício ou insinuação que indique a realidade, é incômoda. E ele rapidamente se afasta, volta para a sua bolha, onde ele é piloto, rápido. Onde nada de errado acontece.
E mente. Mente descaradamente. Quantas vezes ouvi “eu vinha devagar, ali pelos 220, 230…”, ou “rapaz, só tenho andado a 300…”.
Ao invés de investir em conhecimento, treinamento, conversas de nível onde procure desenvolver técnicas para melhor aproveitar o imenso potencial oferecido pelas superbikes modernas, ele se isola, acreditando que o reflexo, o talento e a sorte irão salvá-lo.
A sorte salva muito, mas o reflexo mata.
Nossos reflexos e instintos são desenvolvidos há 50 mil anos para detectar e reagir a perigo/comida/sexo. Nossos reflexos e instintos são péssimos pilotos e sempre tomam decisões que são contrárias ao que é necessário para pilotar uma moto em uma situação de alarme.
Pilotar uma moto esporte é justamente dominar o instinto, é dominar os reflexos, é se manter no controle o tempo todo para tomar as melhores decisões e ocasionalmente, salvar a própria vida.
Para isso existe o conhecimento, a técnica, a maneira certa de fazer as coisas.
Existem aqueles que sempre irão falar que isso é tudo baboseira, que eles andam rápido sem nunca terem estudado nada, no talento, no instinto. As pessoas são diferentes em suas capacidades. Algumas realmente são mais talentosas e fazem as coisas parecerem mais fáceis. E que aprendem a fazer as coisas certas por repetição, caindo e levantando, do jeito mais difícil.
Eu digo que é possível sim, andar rápido e mal ao mesmo tempo. Andar rápido e sem margem, contando com a sorte e com as estatísticas. É aquilo, sem saber que era perigoso ou difícil, foi lá e fez, quase inocente. Mas um dia dá merda. Quantos de nós já acompanhamos um companheiro assim, que vai fazendo tudo errado e que por milagre chega inteiro e feliz da vida ao destino?
Nenhuma experiência passada prepara adequadamente para os desafios de andar rápido com uma 1000cc moderna. O indivíduo pode ter tido tantas “viúvas negras” ou outras motos. Não vale de quase nada. As motos esporte modernas andam e são comparáveis as motos de GP de 10 anos atrás. Não são para qualquer um, sem um preparo adequado.
Outros países sabem disso, e exigem uma perícia e habilidades maiores para quem deseja possuir um foguete destes. Outros limitam a potência. Motos francesas, por exemplo, tem um máximo de 100 cv.
Aqui vale tudo. Basta fazer o cheque e sair andando. Isso não é certo. Tem que existir uma escadinha para preparar nossos motociclistas com mais responsabilidade. Estas operações da Policia nas estradas ocorrem porque estão caindo muito, se acidentando muito, morrendo muito.
A culpa está em vários lugares. Na legislação frouxa que não exige habilitação especial para um veículo especial, nos próprios proprietários, que se jogam na estrada sem nenhum preparo e em todo o grupo, que de modo geral
prefere fanfarronices e besteiras ao invés de investir em segurança e conhecimento.
Se poucos morrem, se poucos se acidentam, eu duvido que a polícia estivesse reprimindo e acabando com este nosso prazer.
Abraços
Mário Barreto