Que tristeza, “ele não!” Ouvi isso algumas vezes.
Porque ele não? Porque ele foi um cara muito especial.
Nick Hayden foi um campeão especial.
Todos os pilotos tem seus pontos fortes e fracos. Nick excedia em ser gente boa, um homem bom, íntegro, sempre simpático, sempre solícito. O moleque de Kentucky, o genro que eu queria para as minhas filhas. Jovem, bonito, simpático, campeão, rico e capaz de fornecer umas credenciais vermelhas da Dorna para o sogrão!!! É difícil querer mais!!!
Nick corre desde criança, de uma família de corredores, seus irmãos também são pilotos. Uma curiosidade, vc sabe porque ele escolheu o número 69? Porque ele caía muito e o 69 é igual de cabeça para baixo!
Chegou na Europa para ser companheiro de Valentino Rossi, vestindo o manto sagrado da Honda Repsol. Foi meio que esnobado pelo circo do MotoGP, que é feito para produzir campeões espanhóis e italianos.
Mas a toda poderosa American Honda não o colocou lá de bobeira. É claro que era necessário ter um americano bom correndo no MotoGP para o bem do negócio, da audiência. Já tinha tempo que a era de Roberts, Spencer, Rainey, Schwantz tinha passado. Precisavam de um americano bom e o Hayden chegou lá com uma credencial prá lá de boa. Ele venceu o imbatível Mat Madlin no AMA SBK. Isso, na época, e o Vitor Braga Cabeção irá concordar, era tão difícil como ir a Lua. Com esta façanha no colo, a American Honda o colocou ao lado do Rossi, e o mundial fez beicinho.
Mas Nick Hayden nunca se abalou com isso, ao contrário, sempre foi um piloto exemplar profissionalmente. Nunca reclamou da moto, nunca criou qualquer problema na equipe ou com companheiros de equipe, sempre disposto para testes, marketing, sempre sorridente e solícito para entrevistas. Foi companheiro do nosso Alex Barros no HRC, com quem se deu muito bem também.
Ao contrário, a Honda Repsol fez de tudo para atrapalhar o Hayden e dar o campeonato de 2006 para o espanhol Dani Pedrosa. Não conseguiram, pois as regras dizem que o campeão não é o favorito, não é o mais rápido, não é o mais vencedor. O campeão é quem marca mais pontos no final do campeonato e mesmo com apenas 2 vitórias no MotoGP, contra mais de 20 de Dani Pedrosa, Nick Hayden teve a honra e o prazer de ser o primeiro americano a vencer no MotoGP, o primeiro e único americano a ser campeão de MotoGP. Legend of MotoGP.
Mesmo assim os europeus continuaram o menosprezando. Deram para ele uma “mini-Honda” para defender o seu campeonato, uma moto feita para o peso pulga do Dani Pedrosa. Ele não cabia na moto.
Foi para a Ducati e trabalhou muito na moto, em um momento difícil para marca, sem nunca reclamar ou se atrapalhar. Sempre um embaixador na marca, do MotoGP, em grande campeão. Venceu também as prestigiosas 8 horas de Suzuka.
Ano passado foi para o WSBK. Levantar o nível deste campeonato. Nunca teve uma Fireblade no nível das Ninja’s ou Panigale’s, mas venceu uma prova. Um dos poucos que venceu no MotoGP e SBK também. Este ano vinha sofrendo com outra Fireblade pouco competitiva, mas fiel ao seu estilo, com um sorriso no rosto e trabalho duro.
É uma enorme perda para o motociclismo mundial, um piloto adorado. Minha esposa Karina gostava tanto dele também que me deu um relógio Tissot comemorativo e numerado, celebrando o seu campeonato mundial. Veio dentro de um mini capacete, uma coisa linda. Agora ainda mais significativo.
Morrer desta maneira, que parece ser meio besta… sobreviver a batalhas contra Mat Madlin e vencer. Sobreviver a batalhas contra Valentino Rossi e o resto do mundo e vencer… e não sobreviver a um atropelamento de bicicleta. Muita gente morre assim, o ciclismo é muito perigoso na questão de atropelamento.
Os Hayden são tão legais que tenho a certeza de que deixaram os aparelhos ligados e anunciar a sua morte apenas hoje, para não estragar a corrida de domingo. Parece esquisito, mas os Hayden são assim.
Que os familiares e fãs encontrem consolo de alguma maneira. Melhor ir para um outro mundo, do que ficar aqui com sequelas. Ficaremos com a imagem dele sempre feliz, para sempre campeão, para sempre um favorito. Uma estrela no céu.
Mário Barreto – de luto.
Muito boa sua síntese. Fiquei especialmente triste. Como vc sabe tenho um carinho especial pelos pilotos americanos, pelo simples fato de ter ido a abertura do campeonato americano antigo AMA por 32 anos e com certeza muito desses garotos devem ter passado correndo de fraldas pela minha frente. Vi o Nicky e outros começarem suas carreiras profissionais no até então maior campeonato de superbike do mundo. Sim o AMA foi o pai do WSBK. Os primeiros campeões mundiais saíram do AMA. Vi o Nicky fazer todas suas corridas na abertura do campeonato americano de superbike em Daytona. Vi ganhar de SS600cc e ganhar o prestigiado Daytona 200 em 2002, antes de ingressar no mundial de GP. Esse ano teve um fato inusitado. Meu companheiro de viagem e rookie em Daytona foi nosso amigo Bebeto. Não sei como consegui arrastar ele pra la. (Primeira e única vez). Nessa época o jovem Hayden já era um ídolo nacional . Tinha todas as credenciais pra o HRC colocá-lo no mundial. Além de ser muito jovem, tinha batido vários renomados campeões do AMA. Como Mat Madlin, Miguel Duhamel , Scoth Russel etc. Como vc relatou teve que encarar todo o bairrismo da imprensa européia. Era um estranho no ninho. Mas com seu jeito cativante e seu talento foi construindo seu espaço e em 3 temporadas se tornou campeão do mundo. Poderia falar falar um monte de histórias , mas teria que me alongar muito. Infelizmente a vida e assim. Acho uma ironia do destino um cara que pôs a cabeça a prêmio desde criança nas corridas de motocicleta pelo mundo a fora, ter tomado centenas de tombos, perder sua vida num acidente de bicicleta. Estatisticamente dizem que acidentes fatais com bicicleta na Europa são maiores que com motocicletas. O nível de proteção na bicicleta de estrada é praticamente zero.