Motovi Harley Davidson

Com R$17,00 de saldo no banco, um dos meus maiores prazeres é ficar olhando classificados de motos e carros. Meu sonho é o de um dia ter uma garagem e oficina bem grande e equipada, além de um saldo bancário um pouquinho melhor, para ficar comprando, desmontando, reformando e montando carros e motos incríveis que eu fico olhando na internet.

Tenho minhas preferências, é claro. Tenho também um monte de idéias bacanas. É ótimo para chamar o sono. Vou desmontando mentalmente, mexendo, melhorando… até o sono chegar. Recomendo.

Ontem encontrei não sei de onde um anúncio de uma incrível Aermacchi-AMF-Harley Davidson-Motovi-Cagiva SS 125! Em incrível estado.

Esta eu vi chegar aqui, vi vendendo na Mesbla, andei muito na do meu ex-vizinho e amigo Reginaldo.

Esta moto tem uma história incrível e eu, como historiador, adoro contar história. Detesto motociclista ignorante, que fica repetindo que Yamaha 350 é viúva negra e que a Honda CBX 1050 tem som de fórmula 1. Ignorância em estado puro. E o pior é que a maioria dos motociclistas e até os que trabalham com motos, presidentes no Brasil de fábricas de moto, não entendem nada de motos, não tem cultura. São apenas vendedores.

Vou contar então a história desta moto.

No final dos anos de 1960, a Harley Davidson estava quebrada… falindo. No motociclismo estes anos foram dos ingleses com suas Norton e Triumph, BSA… e os japoneses ganhando força para o domínio que mantém até hoje. As pequenas, leves e relativamente potentes motos de dois tempos pareciam ser o futuro, em um mundo que não ligava para a fumaça e nem para o consumo de gasolina.

Neste contexto, de fábrica quase falida, a Harley foi comprada pela American Machine and Foundry, depois de 1970, AMF, Inc. Um gigante industrial americano, que fabricava desde equipamentos para jardinagem até reatores nucleares e iates. Sem falar em raquetes de tênis e também as máquinas para boliches automatizadas. Uma salada incrível!!! Eles tinham esta característica de sair comprando empresas disparatadas e acabaram assumindo o controle da Harley Davidson, que passou a se chamar AMF – Harley Davidson.

Antes disso, em 1960, a Harley Davidson já tinha comprado 50% da divisão de motocicletas da italiana Aermacchi. Esta empresa italiana de Varese, nasceu para fazer aviões e depois da segunda grande guerra, começou a fazer motos para atender a necessidade de transporte barato… Tipo a Ducati, que fazia rádios antes da guerra e passou a produzir motos depois pelos mesmos motivos. Em 1972 a AMF – Harley Davidson comprou/herdou este espólio.

Ó aí uma Ducati Regolarita 2T…

Os americanos e o mundo estavam gostando destas motos 2T e eles embarcaram nessa. Também a Ducati teve suas motos 2T, que hoje ela esconde em sua história.

A AMF HD investiu nos 2T com uma bicilindro 2T projetada pelo engenheiro William Soncini, simplesmente venceu 4 campeonatos do mundo de motovelocidade com o piloto Walter Villa, o de 250cc em 1974, 1975 e 1976, quando ele ganhou também o de 350cc. Sim amigos, a Harley Davidson já foi campeã do mundo de motovelocidade.

Então, lá na Itália, a AMF Harley Davidson inventou a SS 125 2T, uma moto Aermacchi, mas que nunca teve emblema Aermacchi no tanque. A idéia era competir com as 2T japonesas.

Não podia dar certo né? A HD famosa por suas grandes motos, a AMF por suas máquinas automáticas de boliche, a Aermacchi por seus aviões… kkkkk, uma salada indigesta e as motos encalharam lá na Itália.

Aí apareceu a Motovi, para importar e montar este estoque encalhado em Manaus, para vender para os brasileiros incautos. Chegaram a vender algumas com o nome Motovi no tanque, mas logo viram que era uma burrice e começaram a vender como AMF – Harley Davidson e só Harley Davidson. Venderam até acabar o estoque, sem se preocupar com mais nada, até porque em 1978 a Cagiva comprou toda a operação italiana da AMF Harley Davidson, que estava uma zona quase falindo novamente. Em 1981 a Harley Davidson comprou-se de volta da AMF e, em reviravoltas incríveis que o mundo dá, comprou a MV Agusta e Cagiva em 2008! Mas já vendeu, por 1 dólar, kkkkkk. As reviravoltas que este mundo empresarial dá.

Engraçado também é que o Presidente da Motovi foi o Advogado e Conde português de Águeda, o Sr. Manuel José Archer Homem de Mello, ou um homônimo. Não consegui achar nada na Internet falando sobre isso.

Outra coisa que não entendi foi isso:

Este documento da Suframa em Manaus, onde a Motovi é a mais antiga de todas e uma ligação com a Honda… estranho, deve ser bom de estudar.

Bom! Falando da moto em si… Era legal, chamava muita atenção porque era alta, grande perto das minúsculas Hondas CG e Yamaha RX do momento. O acabamento não era japonês, era bem pior, mas não era podre com o de uma FBM, por exemplo. Não eram potentes, as motos tinham porte para andar mais, mas o motor girava baixo e ao subir de giros, com muita má vontade, vibrava. Não se comparava com um motor 2T de Yamaha ou Suzuki. Os comandos eram duros. Uma vez andando, devagar, eram muito gostosas, pois as suspensões e o tamanho delas davam uma posição de conforto. Eram muito mal montadas em Manaus, tinha-se que dar a sorte de pegar uma bem montada. De posse de uma “das boas” era razoável. De posse de uma das ruins, um desgosto só, viviam quebradas.

Duraram pouco e desapareceram. Sumiu a Motovi, sumiu a Mesbla, sumiu a AMF, sumiram as Harley Davidson 125 no Brasil, mas na Itália a Cagiva ainda vendeu algumas com o seu nome no tanque. Agora sumiu a Cagiva também… que mundo ruim…

História e evolução desta moto.

Em 1960 a americana Harley Davidson e a italiana Aermacchi (anteriormente denominada Aeronautica Macchi) localizadas na cidade de Varese, formaram a empresa AERMACCHI HARLEY DAVIDSON para a produção de motocicletas leves na Itália. Desde 1973 a marca se torna AMF-HD, ou melhor, a aquisição da American Machine Foundry no lugar da Aermacchi. A produção de motocicletas é interrompida em 1978, quando a Harley Davidson decide abandonar a produção italiana. No mesmo ano, a Cagiva, nascida como uma pequena fábrica de peças metálicas fundada por Giovanni Castiglioni, liberou a empresa para continuar sua produção de motocicletas.

A Cagiva, é outra parada… os Castiglioni de Varese são os caras mais espertos do mundo, e salvaram a moto.

O NOME TÉCNICO
6F SS 125 é um nome técnico que indica uma série de motocicletas fabricadas de 1975 a 1984, inicialmente produzidas sob a marca AMF-Harley Davidson e continuadas sob a marca Cagiva. O dígito 6F está impresso no quadro em correspondência com o tubo de direção e constitui os dois primeiros caracteres do número de série (V.I.N.). O dígito 6F identifica todos os modelos SS 125 / SST 125. O número de série original tem o seguinte formato: 6F-6xxxx Hx, onde 6F indica o modelo; 6xxxx é a numeração inicial, onde 6 é um número fixo e os quatro dígitos seguintes indicam o número progressivo dos modelos produzidos no ano corrente; H representa a década de produção (H = 197x), enquanto o último dígito representa o ano de produção. Na prática, H5 = 1975, H6 = 1976 e assim por diante. O número de série dos modelos produzidos para o mercado dos Estados Unidos tem o seguinte formato: 6F-1xxxx Hx. Este sistema de numeração serial foi utilizado desde 1975 até 1978. Abaixo uma pequena tabela indicativa:
6F = SS 125 e SST 125
9E = SS 250
7T = SST 250
6A = SS 350 (4 tempos)
8F = SST 350 (2 tempos)

A primeira SS 125 produzida tinha o número de série 6F-60000 H5 (OM 14754). Essas motos tinham freios a tambor nas duas rodas, exclusivamente com raios. A instrumentação consistia apenas no odômetro enquanto ao lado dele estava a chave de ignição. Estava equipado com um motor tipo SX 1971 refrigerado a ar, já montado na Aermacchi X90 – Z90 – SXT anterior. Com o tempo, o motor sofreu pequenas melhorias. Outras características: setas de varinha, tampa de combustível de rosca, carburador VHB 27, apenas duas luzes de advertência: setas e farol alto. Os adesivos no tanque traziam as palavras AMF Harley Davidson e as listras típicas eram opostas umas às outras.

PRIMEIRA EVOLUÇÃO (1978)
Desde 1978, mudanças significativas são introduzidas no equipamento e o nome do modelo passa a ser SST 125 (OM 14754 com atualização OM 17697). Em primeiro lugar, a introdução dos freios a disco na roda dianteira, ao invés do tambor. O sistema elétrico está equipado com uma nova caixa de filtro de ar. O painel de instrumentos é modernizado com a introdução do conta-giros eletrônico (anteriormente ausente) e com a chave de ignição colocada a meio do painel. As luzes são aumentadas de duas para três: bateria de carga (GEN), voltas (TURN), farol alto (HIGH BEAM). As listras no tanque diminuem de 6 para 5 e assumem a conhecida configuração adotada até 1983. Estas nunca vieram ao Brasil.

O ÉPOCA CAGIVA (1979)
A fábrica da Schiranna (VA) foi cedida pela Cagiva que continuou a produzir os mesmos modelos Harley Davidson. A habilidade da Cagiva foi relançar a empresa por meio de uma operação de marketing inédita. Em particular, a SST 125 se tornou a moto mais vendida na Itália, estabelecendo um recorde. Seguindo acordos comerciais, as motocicletas foram produzidas sob a dupla marca HD-Cagiva. O sistema de numeração do número de série assume o formato 6F-xxxxx, onde 6F indica o modelo e xxxxx indica o número de unidades produzidas, independente do ano atual. O primeiro número de série HD-CAGIVA SST 125 é 6F-81000. Uma nova homologação (OM 19201) foi solicitada e obtida para o modelo SST 125, que será estampada no quadro a partir de 6F-82102. Foi nesta circunstância que a Cagiva colocou o friso do “elefante” italiano na moto para substituir a “águia” americana. Após cerca de um ano, a marca dupla foi abandonada em favor da indicação apenas Cagiva, começando com o chassi 6F-84123.

SEGUNDA EVOLUÇÃO (1980-1983)
Em 1980 a Cagiva apresentou o modelo SST com diversas melhorias, sobretudo estéticas: protetor de corrente reto, carburador VHBT 27 AD, retirada do bloco de comando no guidão direito (parada do motor) e substituição do bloco de comando no guidão esquerdo, encaixe na tampa de combustível, logotipo Cagiva no cárter esquerdo, setas com haste de borracha dura, manivela reta. Havia a possibilidade de escolher duas variantes: RR clássico com rodas raiadas ou RL com rodas de liga leve moldadas, moda naqueles anos. Havia quatro cores disponíveis: azul metálico, preto, branco, cinza.

As vermelhas foram posteriormente reintroduzidas em uma série limitada. O número de série inicial do modelo 125/81 é 6F-91524, enquanto o número de série inicial do modelo SST/82 é 6F-104024.
Em 1982, o modelo SST 125 foi objeto de mais uma inovação: a partir do chassi 6F-108816 foi instalada a ignição eletrônica. Até então, o sistema elétrico, ao contrário do 250 e 350, era alimentado por um alternador de volante mecânico Dansi com disjuntor de contato; o novo volante eletrônico era um “Mini 6 Hierro” da Motoplat espanhola.

Modelo RR com rodas raiadas
Modelo RL com rodas de liga

TERCEIRA EVOLUÇÃO (1983-1984)
Após o grande sucesso alcançado por sua moto, a Cagiva decide apresentar uma nova gama de modelos denominada ALETTA (ALA para 250 e 350 cc), nome anteriormente utilizado para os modelos Aermacchi. O novo restyling assinalou o abandono do estilo Harley Davidson em favor da nova categoria denominada motocicleta enduro que estava conquistando as novas preferências dos clientes. Assim começaram os tempos da lendária Aletta Rossa, outro grande sucesso da Marca. Nesta fase a SST manteve substancialmente as suas características de moto de estrada, praticamente sempre com o antigo motor HD. O modelo chamava-se Cagiva Aletta SST 125 cujo número de série inicial era 6F-121025 com várias renovações entre as quais: a carenagem dianteira, um novo painel de instrumentos com a adição de várias luzes avisadoras (óleo, ponto morto, gasolina reserva), mudança da rabeta traseira e seu suporte. As típicas listras foram abandonadas e substituídas por um desenho que lembrava a forma da moto. O logotipo “Cagiva” no tanque foi gravado. Para instalar a luz “neutro” foi necessária uma pequena troca de motor: no lado esquerdo do cárter foi instalado um interruptor. A Aletta SST foi produzida exclusivamente com rodas integrais, prateadas ou douradas. A Aletta SST 125 foi ladeada por uma versão extravagante: a SST 125 C, uma moto customizada mais conhecida como Cagiva Low Rider. O modelo tinha rodas raiadas padrão, assento duplo, guidão chopper e para-lamas cromados. O chassis e o motor eram idênticos.

Aletta SST com carenagem
A Low Rider

O FIM DA SST (1984)
A Cagiva entendeu em que direção o mercado estava se movendo, atendendo às necessidades do público e lutando contra a forte concorrência de fabricantes italianos e estrangeiros. Os clientes, principalmente os jovens, apostavam nos modelos “enduro” mais versáteis e com motores cada vez mais modernos e de alto desempenho. Os motores HD agora estavam obsoletos. Nos últimos meses de produção, a Cagiva fez um restyling do SST: o Aletta SST 125 foi renomeado como ALETTA OFFICIAL. Na verdade, nada mudou, exceto a carroceria bicolor com assento verde oliva. Os adesivos sumiram e sobrou apenas um nas caixas da esquerda e da direita para lembrar o nome do modelo. Por outro lado, a Cagiva já apostava tudo na nova moto de estrada que iria suplantar as SST, ou seja, a Aletta Electra. A motocicleta 6F SS já havia feito sua parte e sua produção foi abandonada após quase 10 anos de sucesso.

 

O motor SX

O motor SST é derivado de um motor SX (ano 1971) que equipava os modelos Aermacchi HD anteriores, incluindo Z90, X90, SX125, SS125. Ao longo dos anos foi modificado para caber nos vários modelos. A identificação do número de série está impressa até as tampas do cárter. Na caixa esquerda está impresso o Cagiva SX, enquanto na caixa direita está impresso o próprio número de série. Tem o seguinte formato:

Y yyxxxxx

onde Y é um caractere padrão, yy indica os dois últimos dígitos do ano de construção e xxxxx é o número de unidades produzidas naquele ano. Por exemplo, Y 8302603 indica o motor nº 02603 fabricado no ano de 1983.

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Publicitário, Designer, Historiador, Jornalista e Pioneiro na Computação Gráfica. Começou em publicidade na Artplan Publicidade, no estúdio, com apenas 15 anos. Aos 18 foi para a Propeg, já como Chefe de Estúdio e depois, ainda no estúdio, para a Agência da Casa, atual CGCOM, House da TV Globo. Aos 20 anos passou a Direção de Arte do Merchandising da TV Globo onde ficou por 3 anos. Mudando de atuação mais uma vez, do Merchandising passou a Computação Gráfica, como Animador da Globo Computação Gráfica, depois Globograph. Fundou então a Intervalo Produções, que cresceu até tornar-se uma das maiores produtoras de Computação Gráfica do país. Foi criador, sócio e Diretor de Tecnologia da D+,depois D+W, agência de publicidade que marcou uma época no mercado carioca e também sócio de um dos primeiros provedores de internet da cidade, a Easynet. Durante sua carreira recebeu vários prêmios nacionais, regionais e também foi finalista no prestigiado London Festival. Todos com filmes de animação e efeitos especiais. Como convidado, proferiu palestras em diversas universidades cariocas e também no 21º Festival da ABP, em 1999. Em 2000 fundou a Imagina Produções (www.imagina.com.br), onde é Diretor de Animações, Filmes e Efeitos até hoje. Foi Campeão Carioca de Judô aos 15 anos, Piloto de Motocross e Superbike, mantém até hoje a paixão pelo motociclismo, seja ele off-road, motovelocidade e "até" Harley-Davidson, onde é membro fundador do Museu HD em Milwaukee. É Presidente do ForzaRio Desmo Owners Club (www.forzario.com.br) e criou o site Motozoo®, www.motozoo.com.br, onde escreve sobre motociclismo. É Mestre em Artes e Design pela PUC-Rio. Como historiador, escreve em https://olhandoacidade.imagina.com.br. Maiores informações em: https://bio.site/mariobarreto

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